Ano 1 - Nº 1 - 1/2007

2. O Ensino e a Aprendizagem de Línguas nos Primeiros Tempos do Brasil

Resumo:
Este trabalho, por meio de pesquisa bibliográfica, de caráter histórico, tece um esboço do ensino de línguas no Brasil, na ocasião da chegada dos portugueses no país, a partir dos anos 1500. Inicialmente, damos ênfase ao caráter informal da aprendizagem utilizada pelos estrangeiros para aproximação com os nativos. Posteriormente, destacamos os aspectos relativos ao trabalho desenvolvido pelos jesuítas na implantação, organização e manutenção das instituições educativas a partir da 2ª metade do século XVI até meados do século XVIII, quando estes foram expulsos. Por fim, realizamos algumas considerações acerca da Reforma Pombalina e suas implicações para as bases pedagógicas do ensino, que findou por marginalizar as línguas e literaturas estrangeiras modernas.

Palavras-chave: Ensino e aprendizagem, história, ensino jesuítico, Reforma Pombalina.

ABSTRACT: This study, through a historic literature review, sketch out language teaching in Brazil, when Portuguese people arrived here from 1500 on. At the beginnig, we emphasize the informal characteristic of learning used by the foreigners in order to get along with native people. Lately, we examine aspects regarding the Jesuit work implementing, organizing and maintaining educational intitutions from the second half of the XVI century to the XVIII century, when they were expelled. We also discuss Pombalina Reform and its implications to teaching pedagogical basis, which ends in marginalizing foreign languages and literature.

Keywords: teaching and learning, history, Jesuit teaching, Pombalina Reform.

O início da história do ensino de línguas estrangeiras no Brasil coincide com a chegada dos portugueses em 1500. O português, à época uma língua estrangeira, começou a ser ensinado aos índios na escola catequética.

Ao lado do português, o tupi acabou usado como língua geral na colônia e o seu aprendizado, geralmente informal, se dava pelos portugueses como intuito de se aproximarem mais dos índios para o contato social e trabalho de catequese. Usavam-se todos os artifícios que pudessem ser úteis para impressionar o gentio: o teatro, os cânticos e danças.

Em 1549, juntamente com o primeiro governador geral, chegaram os primeiros jesuítas que trouxeram com eles, não só a moral, os costumes e a religiosidade européia; mas também seus métodos pedagógicos baseados na repetição e imitação de textos clássicos, latinos e gregos.

Sob o comando de Padre Manoel da Nóbrega, os jesuítas fundaram a primeira escola elementar brasileira em Salvador e trouxeram de Portugal, na mesma época, sete órfãos portugueses, “moços perdidos, ladrões e maus, que aqui chamam patifes”, doutrinados na fé católica para facilitar o ensino dos meninos indígenas.

Nóbrega elaborou o primeiro esboço de um plano nacional de estudos, baseado no Ratio Atque Instituto Studiorum, pois ao perceber
que não seria possível converter os índios à fé católica sem que soubessem ler ou escrever, ofereceu-lhes instrução formal constituída de alfabetização e catequização.

O português era ensinado pelos padres jesuítas aos índios para assimilá-los ao cristianismo e aqueles aprendiam o tupi para facilitar ainda mais seus objetivos.

As práticas educativas da Companhia de Jesus, fundada em 1534 por Inácio de Loyola em Portugal, eram bastante resistentes a mudanças, aceitando somente as práticas indígenas que não oferecessem ameaça às suas orientações educativas. Rejeitava-se o espírito científico em favor de ideais humanísticos na acepção mantida pelo clero.

Em 1553, foi fundada a segunda escola brasileira: Colégio dos Meninos de Jesus de São Vicente, onde se ensinava a falar, ler, e escrever o português e também a gramática latina aos mamelucos “mais capazes”. Depois de fundada a cidade de São Paulo, o Padre Manoel da Nóbrega recrutou o jovem José de Anchieta na capitania de São Vicente, onde o mesmo se tornaria o primeiro mestre do Colégio de Piratininga (1554), localizado em um sítio que viria a ser o berço e o marco da cidade de São Paulo. Em seguida, Nóbrega transfere para o planalto 12 irmãos para que estudassem gramática e servissem de intérpretes para os índios, sempre com o propósito de conversão.

Outros colégios jesuítas foram fundados no Rio de Janeiro (1567), Olinda (1568), Maranhão (1622), São Paulo (1631), Santos, Pará e São Luiz (1652). Ao final do período jesuítico, já existiam 25 residências, 36 missões, 17 colégios, seminários menores e escolas elementares.

Além de instituições educativas, os jesuítas produziram gramáticas e dicionários, como: Arte de Gramática da Línguas mais Usadas na Costa do Brasil (José de Anchieta-1590); Catecismo na Língua Brasílica (Antônio de Araújo-1618); Vocabulário da Língua Brasílica e Dicionário Português-Brasiliano (anônimos); Arte da Língua Brasílica (Luís Figueira-1621); Arte, Bocabulário y Tesoro de La Lengua Guarani (Antônio Ruiz de Montoya-1639/1640); Catecismo da Doutrina Christã na Língua Brasílica da Nação Kiriri e Arte da Gramática da Língua Brasílica da Naçam Kiriri (Luís Vicencio Mamiani-1698/1699); Gramática da Língua Geral do Brasil com Hum Diccionario dos Vocábulos mais Uzuaes para a Intelligencia da Dita Língua (1750 no Pará).

O documento final do Plano de Estudos da Companhia de Jesus, o “Ratio Atque Instituto Studiorum Societatis Iesu”, foi finalizado em 1599. O plano contemplava o que hoje se conhece como ensino fundamental, médio e superior. Loyola, contudo, proibiu cursos superiores como: Direito Canônico, Leis e Medicina. O Ratio era formado por três cursos sucessivos: Letras ou Humanidades, Filosofia ou Artes e Teologia. O curso de Letras dividia-se em gramática, humanidades e retórica, tendo duração média de sete anos e tinha o objetivo de permitir a aquisição de uma expressão oral e escrita, elegante, correta, erudita e de eloqüência persuasiva na língua latina (que era base da formação da elite colonial). A metodologia do ensino em todas as disciplinas exigia longa preparação do professor e grande esforço de memória dos alunos, obrigados a decorar as aulas.

Outras línguas também trouxeram contribuições à língua falada na colônia. A influência africana no português do Brasil veio principalmente do iorubá (falado pelos negros da Nigéria) e o quimbundo angolano.

O Guarani antigo era falado no início do século XVII numa região (que era colônia espanhola) que abrangia duas grandes áreas, a do rio Uruguai e a chamada Província do Guairá, que hoje corresponde à região missioneira do Rio Grande do Sul e Argentina e ao atual estado do Paraná.

A ordem religiosa jesuíta reinou absoluta na educação brasileira por 210 anos, encerrando-se com o Alvará de 28 de junho de 1759 que determinava a expulsão dos jesuítas. Esse documento foi idealizado pelo então primeiro ministro, o Marquês de Pombal, em função de objetivos radicalmente diferentes. Enquanto os jesuítas se preocupavam com o proselitismo e o noviciado, Pombal pensava em garantir autonomia econômica para Portugal, fortalecendo o Estado e reorganizando a administração colonial a fim de garantir a transferência do máximo de riquezas brasileiras para o reino português que lutava para recuperar a posição de grande potência. Em 1758, o Marquês, proibiu o ensino e o uso do tupi e instituiu o português como única língua do Brasil com a finalidade de enfraquecer o poder da Igreja Católica sobre a colônia.

O Alvará determinou também a instituição de aulas régias (de disciplinas isoladas) de gramática latina, aulas de grego e de retórica, além da prestação de exames para todos os professores, que passaram a gozar do direito de nobres.

Em cada aldeia indígena, os diretores, que impuseram o uso do português e proibiram o uso do tupi, ocuparam o lugar dos missionários e implantaram duas escolas publicas (uma para meninos e outra para meninas).

As orientações foram de formar o perfeito nobre (agora negociante), simplificar e abreviar os estudos para que mais pessoas se interessassem pelos cursos superiores, propiciar aprimoramento da língua portuguesa e diversificar o conteúdo tornando-os os mais práticos possíveis.

Contudo, a Reforma Pombalina conseguiu somente desmantelar a estrutura construída pela Companhia de Jesus sem romper com suas bases pedagógicas, pois os mestres-escola formados pelos jesuítas foram naturais continuadores de seus ideais. Os atos do Marquês terminaram por reduzir a educação brasileira a aulas isoladas (aulas régias), professores leigos, mal preparados e mal pagos, além de contribuir para uma baixíssima freqüência de alunos nas escolas e manter excluídos os estudos das ciências naturais, línguas e literaturas modernas, como fizeram os jesuítas.

 

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